Apesar do cronograma já em andamento e de mais de 100 mil inscrições confirmadas nas primeiras 24 horas, o Concurso Nacional Unificado (CNU) 2025 ainda pode ser suspenso. O motivo? Um novo pedido protocolado pelo Ministério Público Federal (MPF) junto à Justiça Federal do Distrito Federal, que aponta falhas persistentes na aplicação das cotas raciais no processo seletivo.

A solicitação foi feita dois dias após a publicação do edital, reacendendo o debate sobre a condução da política de cotas do "Enem dos Concursos". De acordo com o MPF, o edital lançado no dia 30 de junho pelo Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI) não apenas ignora denúncias recebidas após a primeira edição, como também mantém falhas que, segundo o órgão, comprometem a efetividade do sistema de cotas previsto em lei.

Reincidência de falhas e omissões

O MPF afirma que, desde o encerramento do primeiro CNU, foram recebidas dezenas de denúncias de candidatos negros que concorreram às vagas por cotas raciais. As reclamações concentram-se, sobretudo, no processo de heteroidentificação, etapa na qual comissões especializadas avaliam a autodeclaração racial dos candidatos. Entre os problemas apontados estão a ausência de critérios claros, falta de transparência, dificuldades de recurso e desrespeito ao direito ao contraditório.

Mesmo com esses alertas, o edital de 2025 teria sido publicado sem ajustes. O MPF reforça que os erros estruturais permanecem e que isso motivou a nova Ação Civil Pública (ACP) ajuizada em 25 de junho, dias antes da abertura das inscrições. Nessa ação, o órgão pede que o governo comprove a implementação de mudanças capazes de corrigir os vícios identificados anteriormente, o que não teria ocorrido até o momento.

Quais são as principais críticas do MPF?

Confira os pontos destacados pelo Ministério Público Federal que embasam o pedido de suspensão do CNU 2025:

1. Comissões de Heteroidentificação

Segundo o MPF, houve graves falhas na atuação dessas comissões na edição anterior. Candidatos relataram decisões arbitrárias, ausência de justificativas individualizadas e restrições no direito de defesa e recurso. Para o órgão, a manutenção do mesmo modelo compromete a equidade do certame.

2. Sorteio para Aplicação das Cotas

O sorteio utilizado pelo MGI para distribuir proporcionalmente as vagas para cotistas nos cargos com menos oferta foi criticado por falta de transparência e ausência de controle externo. Apesar de transmitido ao vivo pelo YouTube, o procedimento não teria garantido segurança jurídica suficiente, segundo o MPF.

3. Reserva Proporcional por Modalidade de Cota

O edital não explicita como será feito o controle do cadastro de reserva para candidatos cotistas ao longo da validade do concurso, o que dificulta o acompanhamento da política de cotas. A ausência dessa previsão, segundo o MPF, pode resultar em descumprimento da legislação vigente.

4. Listas Classificatórias Específicas

O órgão também aponta a falta de clareza quanto à publicação das listas específicas para candidatos de cotas e a ausência de informações sobre o ranqueamento contínuo, o que inviabiliza o monitoramento da política afirmativa durante toda a vigência do concurso.

Governo ainda não foi notificado

Apesar do pedido do MPF, até o momento o processo ainda não resultou em qualquer liminar ou decisão da Justiça Federal. Segundo a Advocacia-Geral da União (AGU), a União não foi intimada para se manifestar. O Ministério da Gestão, por sua vez, também afirmou que não recebeu nenhuma notificação judicial até a última sexta-feira (4).

Ainda assim, cresce a expectativa sobre um possível desdobramento que pode interferir no calendário do concurso, que segue com inscrições abertas até o dia 20 de julho por meio do site da FGV (conhecimento.fgv.br/cpnu2).

O que diz o edital do CNU 2025?

A segunda edição do Concurso Nacional Unificado oferece 3.652 vagas distribuídas entre 32 órgãos do governo federal. As oportunidades estão organizadas em nove blocos temáticos e abrangem áreas como gestão pública, saúde, meio ambiente, infraestrutura e regulação.

Diferente dos concursos tradicionais, o CNU tem a proposta de ampliar o acesso de candidatos de todo o país, com provas previstas para serem aplicadas em 236 municípios, medida que visa descentralizar o acesso aos cargos federais.

A banca responsável é a Fundação Getulio Vargas (FGV), que organizou toda a logística do novo edital.

Denúncias na primeira edição ainda repercutem

As críticas do MPF não se limitam ao edital atual. Em junho deste ano, o órgão já havia ingressado com uma ACP contra a Fundação Cesgranrio, organizadora da primeira edição do CNU, e o próprio MGI. A ação denunciava irregularidades na condução da heteroidentificação e falhas no direito de defesa dos candidatos cotistas.

Conforme o MPF, muitas das recomendações apresentadas nessa ação não foram acolhidas no edital de 2025, o que reforça o argumento de reincidência e embasa o pedido para suspensão imediata da seleção.

E agora? O CNU pode mesmo ser suspenso?

A decisão está nas mãos da Justiça Federal do DF, que deve avaliar a procedência da ação civil pública. Caso entenda que há risco de prejuízo às políticas afirmativas e aos direitos dos cotistas, a suspensão pode ser determinada mesmo com o processo de inscrições em curso.

Enquanto isso, os candidatos seguem se inscrevendo e se preparando, mas com um alerta no radar: o futuro da seleção ainda depende de uma decisão judicial.