A credibilidade dos concursos públicos voltou a ser abalada nesta semana. A Polícia Federal (PF) deflagrou, na quinta-feira (2), uma operação de grande porte para desarticular uma organização criminosa especializada em fraudar seleções públicas em diversos estados. A investigação revelou indícios de que o esquema fraudou o Concurso Público Nacional Unificado (CNU) de 2024.

O caso veio à tona após uma apuração conjunta entre a PF, o Ministério da Justiça e Segurança Pública e o Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos (MGI). Segundo o relatório preliminar, há provas de que alguns candidatos tiveram acesso antecipado aos gabaritos oficiais das provas, prática que viola diretamente a lisura dos certames e coloca em risco a credibilidade de um dos maiores processos seletivos do país.

Além do CNU, o esquema teria atingido concursos da Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil, Polícias Civis de Pernambuco e Alagoas e da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Foram cumpridos 12 mandados de busca e apreensão, além de prisões preventivas, medidas cautelares e bloqueio de bens em cidades da Paraíba, Pernambuco e Alagoas.

Como o esquema funcionava

A PF detalhou que o grupo atuava de forma sofisticada, utilizando diversos métodos de fraude. Entre as táticas identificadas estavam o uso de pontos eletrônicos durante as provas, falsificação de documentos para permitir que terceiros realizassem os exames no lugar dos verdadeiros candidatos e, o mais grave, o acesso antecipado ao conteúdo das provas e gabaritos.

Três pessoas foram presas preventivamente, sendo duas em Recife (PE) e uma em Patos (PB). Ao menos 16 candidatos foram identificados como participantes diretos das fraudes. Parte deles já havia sido aprovada e nomeada em cargos públicos, sendo afastada imediatamente após a confirmação das irregularidades.

Os investigados responderão por fraude em concurso público, falsificação de documento público, organização criminosa e lavagem de dinheiro.

Fraude no CNU: como foi descoberta

A suspeita de irregularidades no CNU começou após a constatação de que quatro candidatos apresentaram gabaritos praticamente idênticos, inclusive com os mesmos erros e pontuações semelhantes. Todos tinham notas baixas na redação e eram da mesma região, Patos, na Paraíba.

Entre os investigados estão Wanderlan, ex-policial militar e apontado como o líder do esquema; Valmir, seu irmão; Larissa, sobrinha de Wanderlan; e Ariosvaldo, um policial militar do Rio Grande do Norte. Todos foram aprovados no CNU 2024 para o cargo de Auditor-Fiscal do Trabalho (AFT).

As investigações também apontam a participação de Luiz Paulo, servidor da Justiça Federal do Rio de Janeiro, suspeito de envolvimento em mais de 60 fraudes em concursos anteriores. Ele teria vínculos familiares com pessoas de Patos e também foi aprovado no CNU.

Um ponto curioso chamou a atenção dos investigadores: Wanderlan e Luiz Paulo, embora aprovados, não compareceram ao curso de formação, o que levantou a hipótese de que eles tenham participado apenas para comprovar a eficácia do esquema aos "clientes" da quadrilha.

Ao todo, a PF já identificou dez candidatos com padrões de resposta idênticos, o que reforça a tese de fraude em larga escala. Veja o gabarito dos candidatos:

Fraude CNU 2024 - gabarito
Fraude CNU 2024 - gabarito

Repercussão nacional e medidas emergenciais

A revelação teve enorme impacto, principalmente pelo envolvimento do CNU, considerado o maior concurso público já realizado no Brasil, com mais de 2 milhões de inscritos em sua primeira edição, em 2024.

O Ministério da Gestão e Inovação (MGI) confirmou, por meio de nota oficial, a existência de uma tentativa de fraude pontual, mas garantiu que os envolvidos foram identificados e eliminados do processo. O órgão destacou ainda que os demais candidatos não foram prejudicados.

Nota oficial do governo

Em comunicado divulgado na sexta-feira (3), o MGI reforçou o compromisso com a transparência:

"O Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos informa que tem apoiado, desde o início, as investigações da Polícia Federal sobre fraudes em concursos públicos, entre elas, uma fraude pontual durante a aplicação da prova da primeira edição do Concurso Público Nacional Unificado. O MGI vem acompanhando os desdobramentos da operação e, em conjunto com o Ministério da Justiça e Segurança Pública, a Polícia Federal e demais forças de segurança, ampliou os mecanismos de fiscalização para garantir maior segurança, transparência e integridade na prova do CPNU 2."