Grande parcela dos candidatos que deseja prestar algum concurso público se pergunta se é permitido que se tenha tatuagem para assumir algum cargo. A resposta costuma ser diferente para cada caso, já que existem instituições que são extremamente enfáticas em negar tal possibilidade.

É o caso, por exemplo, de órgãos como a Polícia Militar (alguns estados), que define já no edital de abertura de seus concursos que os candidatos não devem possuir tatuagens, ou que as tenham somente em locais específicos do corpo. Nestes casos os editas costumam ser didáticos, como no seguinte trecho, retirado do edital de abertura do concurso da PM de São Paulo de 2015:

"Serão permitidas as tatuagens não aparentes quando da utilização de uniforme operacional, (...), salvo quando divulgarem símbolo ou inscrição ofendendo a valores e deveres éticos inerentes aos integrantes da Policia Militar, ou que façam alusão a:

- ideologia terrorista ou extremista contrária às instituições democráticas ou que pregue a violência ou a criminalidade;
- discriminação ou preconceito de raça, credo, sexo ou origem;
- ideia ou ato libidinoso; e
- ideia ou ato ofensivo aos direitos humanos"

Levando em conta que o edital é a lei do concurso, aqueles que desejam concorrer devem se encaixar nas características exigidas pelo documento, já que mesmo sendo aprovados nas primeiras etapas do certame a possibilidade de ser excluído da seleção durante a avaliação médica é grande. O candidato deve levar em conta que os examinadores vão seguir a risca o que é ditado pelo edital e não deixarão passar para as etapas seguintes aqueles possuam tatuagens que estejam fora do padrão permitido.

Entretanto, há aqueles que recorrem à justiça para garantir a sua permanência no concurso, ou mesmo a sua nomeação ao cargo, alegando que um detalhe estático não dificultará ou impedirá que o candidato exerça as funções que são atribuídas ao cargo. Em alguns destes casos a justiça tem dado pareceres favoráveis as candidatos, ancorados no principio de razoabilidade que faz parte de Constituição Federal.

É o que podemos constatar no precedente de 2013 do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, onde um candidato desclassificado em um certame em função de sua tatuagem, entrou com um Mandado de Segurança. Nele, diz o seguinte: "Candidato considerado inabilitado por possuir tatuagem. Princípio da razoabilidade. Exigência que não justifica hipótese de insalubridade. Concessão da ordem. Fazer da tatuagem uma doença incapacitante capaz de, por si só, excluir o candidato, é contrariar os princípios constitucionais da razoabilidade e da proporcionalidade, mormente se a tatuagem é discreta e em nada influenciará na capacidade física da impetrante. (TJSC, Mandado de Segurança n. 2013.013988-2, da Capital, rel. Des. Pedro Manoel Abreu, j. 12-06-2013)".

Ainda nesse sentido, podemos analisar o caso recente, de agosto de 2016, onde o Supremo Tribunal Federal deu ganho de causa a um candidato aprovado que havia sido desclassificado do concurso do Corpo de Bombeiros de São Paulo por também possuir tatuagem: no caso, uma tribal de 14 centímetros na perna direita.

De acordo com o constante no edital do concurso, o concorrente não poderia possuir tatuagem que atentasse contra "a moral e os bons costumes" e que não tivesse "dimensões pequenas", que cobrisse partes inteiras do corpo ou que fossem visíveis durante o uso do fardamento e do traje de treino físico.

Os ministros decidiram, por 7 votos a 1, proibir este tipo de exigência. Ao ver do STJ, só poderia haver alguma proibição caso o desenho da tatuagem incitasse alguma forma de violência ou violasse os "valores constitucionais", como por exemplo, discriminação ou preconceito de raça, cor, ideologia, ou incitação a tortura e terrorismo.

Por ocasião da decisão, o relator da ação no STF, o ministro Luiz Fux salientou que uma tatuagem não desqualifica ninguém para o serviço público.

"Um policial não é melhor ou pior por ser tatuado […] O fato de o candidato, que possui tatuagem pelo corpo, não macula por si, sua honra profissional, o profissionalismo, o respeito às instituições e muito menos diminui a competência", argumentou.

Ainda no julgamento, ele numerou situações em que caberia alguma restrição do tipo.

"A tatuagem, desde que não expressa ideologias terroristas, extremistas, contrária às instituições democráticas, que incitem violência, criminalidade ou incentivem a discriminação ou preconceitos de raça, sexo ou outro conceito, é perfeitamente compatível com o exercício de qualquer cargo público", afirmou.

Este resultado também abre precedente para que as demais instâncias jurídicas  analisem e julguem casos semelhantes da mesma forma.

É necessário perceber, porém, que este principio de razoabilidade também pode ser utilizado para justificar uma decisão desfavorável ao candidato, no caso de a imagem em sua pele ser ofensiva ou ferir algum dos princípios da instituição em que ele deseja ingressar. Ainda cabe citar, que os concursos públicos no Brasil são organizados com o intuito de possibilitar o ingresso de todos os cidadãos que tenham interesse em ocupar determinado cargo público e não há nada na Constituição Federal, que é a lei que está sobre todas as outras, inclusive de um edital, que proíba que um candidato tatuado assuma um cargo e se torne servidor público.

Resta ao candidato, quando tiver interesse de prestar algum concurso, conferir atentamente o edital normativo da seleção, já que uma vez feita a inscrição no certame, o concorrente nunca poderá alegar o desconhecimento do edital. Este fato também serve como base jurídica que pode manter ou excluir um candidato de um concurso, já que a instituição sempre pode alegar que o candidato tinha conhecimento da possibilidade - ou da falta dela - de concorrer às vagas sendo possuidor de tatuagens.