O Bolsa Família, tema de debate político e principal arma de Lula e Bolsonaro nas eleições passadas, vem tendo repasses ampliados nos últimos anos e isso gerou um fenômeno que vem intrigando economistas: uma grande redução na taxa de participação na força de trabalho.

Um estudo exclusivo da Genial Investimentos, divulgado pela CNN, revelou que cerca de dois milhões de brasileiros decidiram deixar o mercado de trabalho formal em decorrência do benefício ampliado.

O programa de transferência de renda, que historicamente representava cerca de 19,8% do salário mínimo, teve um salto durante a pandemia, atingindo 42,6% da renda mínima até dezembro de 2022, quando era chamado de Auxílio Brasil. No governo Lula, retomando o nome de Bolsa Família, o benefício chegou a alcançar a marca de 50% de um salário mínimo em setembro de 2023.

Agora, no mês de fevereiro, com valor médio de repasse de R$ 686,10 e um mínimo de R$ 1.412,00, o valor do benefício equivale a 48,59% do salário mínimo. Isso fez com que mais pessoas deixassem de procurar trabalho num país onde a média salarial geral é de apenas R$ 2.880,00.

No Nordeste, por exemplo, onde há um número maior de recebedores do Bolsa Família, a média salarial é ainda menor, de R$ 1.979,00. Isso fez com que mais pessoas deixassem o trabalho formal para receber o benefício e complementassem a renda na informalidade.

O que justifica este aumento?

José Márcio Camargo, economista-chefe da Genial Investimentos, explica os fatores por trás dessa mudança. Ele destaca que programas de transferência de renda têm o potencial de reduzir o incentivo dos trabalhadores em buscar novos empregos, dependendo do volume da transferência.

O aumento substancial do Bolsa Família tornou o incentivo para trabalhar menor, especialmente para aqueles que ganham um salário ou menos.

O estudo também revela que, desde setembro de 2022, aqueles com pouco estudo foram os mais afetados, perdendo participação no mercado de trabalho. Para Camargo, a escolha de não procurar trabalho devido ao recebimento do benefício é uma decisão racional por parte dos beneficiários.

"Não é uma questão de estar com preguiça de trabalhar, não é esse o ponto. O trabalhador avalia o custo-benefício de trabalhar, se o custo é maior que o benefício, ele não irá trabalhar, esse trabalhador é racional, a diferença não compensa o custo, se ele perder o benefício", afirma.

O aumento no Bolsa Família, de aproximadamente R$ 200 antes da pandemia para R$ 600 atualmente, é apontado como responsável por uma queda adicional de 1,7 ponto percentual na taxa de desemprego em 2023. Isso significa que dois milhões de pessoas deixaram de procurar uma ocupação, impactando diretamente na população economicamente ativa.

Além disso, os pesquisadores destacam outro fator relevante: enquanto os benefícios sociais tiveram um grande aumento, houve uma queda no salário real em 2023 devido à inflação, diminuindo ainda mais o incentivo para o retorno ao mercado de trabalho.

Esse cenário pode explicar porque as previsões para a taxa de desemprego seguem caindo, uma vez que cada vez menos pessoas procuram um trabalho. Em 2023 ela encerrou o ano em 7,5%.