Com o fim do Bolsa Família, cerca de 5,4 milhões de beneficiários do programa social poderão receber um benefício menor do que o atual ou até mesmo o valor da ajuda congelado por alguns anos. A apuração foi realizada pelo jornal O Estado de S. Paulo a partir de um relatório obtido via Lei de Acesso à Informação (LAI).

O documento traz um parecer de mérito emitido pelo Ministério da Cidadania em 2 de agosto, antes da publicação da Medida Provisoria nº 1.061 que cria o Auxílio Brasil, programa substituto do Bolsa Família.

Todos os cálculos foram realizados considerando o orçamento atual de R$ 35 bilhões do programa, uma vez que o governo ainda não conseguiu encontrar uma fonte de recursos para garantir a ampliação do programa ou a elevação do tíquete médio.

Conforme o parecer elaborado pela pasta da Cidadania, em torno de 37% dos beneficiários não devem receber o aumento no valor do benefício, como vem sendo prometido pelo governo há meses. Atualmente, 14,7 milhões de famílias são contempladas pelo Bolsa Família e destes, 5,4 milhões deverão receber o "benefício compensatório de transição" no mesmo valor da diferença.

De acordo com a MP que regulamenta o Auxílio Brasil, o benefício de transição será pago às famílias beneficiárias do Bolsa Família que tiverem redução no valor recebido após o enquadramento no Auxílio Brasil. O recebimento desse benefício não tem prazo fixo e será concedido na implementação do Auxílio Brasil e mantido até que haja revisão da elegibilidade e do valor.

Valor do Bolsa Família deve diminuir

Contudo, conforme mostrou o Estadão, na prática o que pode ocorrer é que as famílias enquadradas nessa situação fiquem alguns anos com o valor da ajuda congelado. Os dados do governo mostram ainda que a redução compensada pelo benefício temporário fica entre R$ 10 e R$ 173. "Para 50% das famílias mais afetadas, a diminuição do valor do benefício será de até R$ 46", informa o parecer.

Segundo o economista Ricardo Paes de Barros, pesquisador do Insper ouvido pelo Estadão, existem duas possíveis explicações para a diminuição no valor do Bolsa Família. A primeira seria a extinção do benefício básico, que atualmente é pago no valor de R$ 89 às famílias na faixa de extrema pobreza.

De acordo com o economista, esse benefício se sobrepõe ao valor pago como benefício de superação da extrema pobreza. O benefício de superação será mantido no Auxílio Brasil e calculado especificamente para cada caso quando a renda familiar mensal for igual ou inferior ao valor da linha de extrema pobreza.

Conforme explica o pesquisador, a família que está próxima de superar a linha da extrema pobreza (possui renda familiar por pessoa perto de R$ 89) recebe pelo desenho atual do programa mais do que o necessário para cumprir o objetivo, num cenário de recursos escassos e de outras famílias à espera de atendimento.

A conclusão é citada no documento elaborado pelo governo, salientando que essa família ainda vai receber mais do que uma pessoa com renda semelhante, mas que está posicionada acima da linha de extrema pobreza.

Outro ponto indicado pelo economista diz respeito ao corte do limite de benefícios variáveis recebidos por filho menor de idade ou gestante. Atualmente, esse teto de benefícios é de sete por família, mas será reduzido para cinco após a implementação do Auxílio Brasil. "Acho que devia ser livre, independentemente do número. É difícil qualquer pessoa que já teve um filho achar que, recebendo mais R$ 45, ou R$ 90 agora (com a mudança), vale a pena ter um filho", diz Paes de Barros.

Conforme informações do Ministério da Cidadania, a folha de pagamento do Bolsa Família em setembro de 2021 foi composta por 63.891 famílias que receberam a soma de benefícios apontada pelo economista. Dessa forma, essas mais de 60 mil famílias poderão ser enquadradas na nova regra e receber um valor ainda menor do que o atual.